Desde orquídeas até crustáceos e sementes.
A curiosidade de Darwin pelo mundo natural era tamanha que,
quando focava em algo, seu interesse não só se convertia em paixão, como também
levava a meses ou anos de experimentos meticulosos.
O naturalista era capaz de enxergar questões profundas em
acontecimentos em que a maioria das pessoas sequer prestaria atenção.
Depois de passar cinco anos a bordo do navio Beagle, quando
deu a volta ao mundo observando espécies da América do Sul à Oceania, Darwin
retornou em 1836 ao Reino Unido, seu país de origem.
O biólogo passou, então, décadas fazendo experimentos em sua
casa em Kent, a cerca de uma hora de Londres, em busca de evidências para sua
teoria da evolução por seleção natural.
Apesar de ter sofrido com problemas estomacais, tonturas,
fadiga extrema e outros sintomas debilitantes ao longo da vida, não desistiu de
seus experimentos.
"Darwin tinha problemas de saúde, e só alguém que
realmente amasse estudar a natureza teria perseverado como ele fez, ao longo de
décadas de experimentos e observações cuidadosas", disse à BBC News Mundo
o professor de biologia Ken Thompson, da Universidade de Sheffield, na
Inglaterra, autor do livro As plantas mais maravilhosas de Darwin.
"A teoria da seleção natural, com toda a sua
importância, pode ser vista como uma consequência do grande amor e curiosidade
de Darwin pelo mundo natural."
Conheça cinco experimentos realizados por Darwin que podem
ser replicados em casa e entenda o que o naturalista britânico buscava
comprovar por meio deles.
Em O Poder do Movimento nas Plantas, que escreveu com um dos
dez filho, Francis, Darwin descreve como constatou que o broto de uma espécie
de planta, a Phalaris canariensis, crescia "torto" quando submedito
ao estímulo da luz.
"Nos surpreendeu ver como a parte superior determinava
a direção da curvatura da parte inferior", escreveu.
Para averiguar se a parte superior do broto era a parte
sensível à luz, o biólogo cobriu a recobriu com uma "capa" de
material opaco. E verificou que, desta vez, a planta não se dobrou em direção à
luz.
É possível replicar esse mesmo experimento: plantar uma
semente e ver como seu primeiro broto curva-se em direção a uma vela acesa, por
exemplo, para então cobrir a ponta com uma "capa" de papel alumínio e
notar a diferença.
Darwin era cuidadoso e paciente quando se tratava de suas
experiências mas, segundo Ken Thompson, "sua verdadeira genialidade estava
em sua habilidade de formular as perguntas corretas".
Neste experimento, "a ideia-chave para Darwin era de
que a parte de uma planta que responde a um estímulo - neste caso, à luz - não
necessariamente é a mesma que percebe esse estímulo".
"E essa constatação leva a uma conclusão inevitável, de
que algo transporta esses sinais de uma parte a outra da planta."
"Darwin descobriu, na prática, o efeito dos hormônios
das plantas, que seguem sendo uma das áreas mais ativas de pesquisa em
fisiologia vegetal."
Em 1857, Darwin analisou as ervas daninhas em seu jardim e
demonstrou que a vasta maioria das sementes que germinam não sobrevive.
A mesma experiência pode ser replicada, delineando com uma
corda um pequeno lote de terreno em que a terra fique exposta e marcando o
lugar em que cada semente nasce.
"A cada dia, eu marcava as mudas de ervas daninhas que
nasceram durante os meses de março, abril e maio. De 357 que apareceram, 277
pereceram, principalmente devido às lesmas", escreveu Darwin.
Mas por que o naturalista estava tão interessado em observar
a morte precoce dos brotos?
Em A Origem das Espécies, Darwin escreveu: "já que mais
indivíduos são produzidos do que os que podem sobreviver, deve haver uma luta
pela existência".
Thompson destaca que a teoria da seleção natural estava
baseada na ideia - então descrita como a sobrevivência do mais apto, por
Herbert Spencer - de que mais organismos individuais nascem do que os que podem
sobreviver.
Somente os mais aptos se reproduzem e passam seus genes à
nova geração.
"Darwin estava interessado em qualquer exemplo desse processo
em ação - neste caso, a morte da maioria dos brotos em um lote de terra".
Darwin passou mais de um ano verificando a capacidade das
sementes de sobreviver na água do mar.
O experimento era crucial para responder aos críticos da
teoria da evolução das espécies.
"A crença dominante na época de Darwin era de que os
animais e plantas eram encontrados nos lugares em que Deus os havia
colocado", explica Thompson.
Encontrar uma mesma espécie em lugares muito distantes entre
si, às vezes mesmo em continentes diferentes, era considerado uma prova desse
desígnio divino.
"Darwin queria mostrar que as espécies podem se
dispersar por distâncias maiores do que as pessoas acreditavam."
"Por isso, provar que as sementes conseguiam sobreviver
durante longos períodos de tempo na água do mar, para então germinar, era
importante, já que implicava ser possível a dispersão por grandes distâncias
por meio das correntes oceânicas", acrescenta.
Plantas carnívoras
As cartas de Darwin revelam que, por volta de 1860, sua
paixão eram plantas carnívoras, como descreve Thompson em seu livro.
O cientista chegou inclusive a se referir a uma delas, a
Drosera rotundifolia, ou orvalho-do-sol, como sua "amada drosera".
Darwin queria descobrir a dieta favorita dessa planta e,
assim, submeteu-a a uma dieta variada, à base de itens como açúcar, leite,
azeite e gelatina.
"As insetívoras eram um exemplo maravilhoso de plantas
que gradualmente evoluíram e desenvolveram uma habilidade de fazer algo que a
maioria das plantas não pode fazer", explicou Thompson à BBC News Mundo.
"Para Darwin, era óbvio que a drosera havia evoluído a
partir das muitas plantas que tinham tricomas glandulares (apêndices que
produzem secreção) por outras razões, como a defesa contra insetos. E podia,
por sua vez, evoluir e se converter em algo diferente, como a chamada
apanha-moscas."
O naturalista também deduziu corretamente que as plantas
carnívoras evoluíram em solos pobres, em que precisavam atrair insetos para
obter nutrientes.
"Considerando o solo em que elas crescem, o nitrogênio
disponível é geralmente muito limitado - o que faz com que muitas delas
absorvam o elemento dos insetos que capturam", escreveu Darwin.
Darwin estudou a relação entre as plantas e os insetos que
as polinizam, uma dependência fruto da coevolução de duas espécies diferentes.
O cientista fez experiências com plantas de trevo vermelho -
processo que pode ser replicado por um leigo.
Antes que o trevo floresça, cubra algumas partes da planta
com uma malha "à prova de insetos". Então compare o número de
sementes produzidas pelas flores cobertas e pelas expostas.
Um dos casos mais famosos de coevolução é o de uma célebre
previsão de Darwin.
O naturalista recebeu de um famoso horticultor inglês, James
Bateman, vários exemplares de uma chamativa orquídea de Madagascar, a
estrela-de-Belém, cujo nome científico é Angraecum sesquipedale - e que ficaria
conhecida como a "orquídea de Darwin".
O que chamou a atenção do cientista foi o comprimento do
nectário ou canal (de cerca de 30 centímetros), cuja parte inferior armazena o
néctar.
"Para Darwin, estava claro que, se uma orquídea tinha
um nectário de cerca de 30 centímetros, esse nectário havia evoluído assim por
uma razão", explica Thompson.
"Ele cultivou Angraecum em sua própria estufa e
antecipou que ela deveria ser polinizada por uma mariposa com uma probóscide
(língua) suficientemente comprida para alcançar o néctar".
Foram necessários cerca de 40 anos para que se descobrisse
uma mariposa com tais características em Madagascar.
"E demonstrar que a mariposa efetivamente polinizava a
orquídea levou mais de um século."
A mariposa foi descrita com o nome de Xanthopan morganii
praedicta, e a última parte de seu nome faz referência à previsão realizada por
Darwin sobre sua existência.
Uma mensagem de Darwin para todos
Os experimentos de Darwin têm uma grande mensagem para todos
nós, segundo Thompson.
"Darwin nunca encarou nada como fixo", afirmou à
BBC News Mundo o professor da Universidade de Sheffield.
"Ele via as mesmas coisas cotidianas que todos nós
vemos, mas sempre buscava nelas um significado profundo."
"O mundo está cheio de perguntas para aqueles que têm
olhos para vê-las."
Via | BBCBRASIL
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