Foto: Getty Images
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Davi, de um ano, começou a apresentar febre alta e perda de
apetite. Em um posto de saúde de Piabetá, na Baixada Fluminense, foi constatada
inflamação na garganta. Cinco dias depois, ainda não havia nenhuma melhora.
"A febre chegou a 41ºC, ele estava cansado e tinha uma
tosse seca. Achei que era bronquite", conta a mãe, Valquíria Farias, 31.
Ao levá-lo a uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), em Petrópolis, o raio-X
indicou pneumonia. Imediatamente foi iniciado tratamento com antibiótico e em
dois dias Davi já estava bem melhor, pronto para as suas estripulias.
A febre alta, assim como cansaço constante, tosse e um ruído
característico nos pulmões que só os médicos conseguem detectar estão entre os
sintomas muitas vezes ignorados de pneumonia, a doença infecciosa que mais mata
crianças abaixo de 5 anos no mundo − mais que HIV, tuberculose, zika, ebola e
malária juntas. Por isso, é chamada "a matadora esquecida de criança"
no relatório Fighting for Breath, da organização Save the Children, divulgado
na semana passada.
Quanto mais rápida for diagnosticada a pneumonia, mais
rápida será a recuperação.
O diagnóstico radiológico é eficaz para observar a
inflamação dos pulmões, porém em muitos casos o médico consegue identificar a
doença no consultório, ao escutar, com o auxílio de um estetoscópio, ruídos
característicos da pneumonia, os estertores crepitantes, que parecem um barulho
de velcro sendo aberto. Diferente dos sibilos, sons típicos de uma bronquite.
Isso tudo, é claro, para os ouvidos treinados de um médico.
"Será de risco para ter pneumonia toda aquela criança
que apresentar tosse e dificuldade para respirar, o que, em termos técnicos,
chamamos de dispneia", explica Patrícia Barreto, pneumologista pediátrica
do Hospital Vitória e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro.
"Terá pneumonia a criança que, ao ser examinada,
mostrar aumento da frequência respiratória e sinais de desconforto
respiratório, ou seja, a respiração mais rápida, a barriguinha entrando,
aparecendo as costelas. A ausência de febre não descarta a doença",
ressalta a especialista. Esses sinais nunca devem ser ignorados pelos pais, que
devem buscar orientação médica prontamente.
Valquíria, mãe de Davi, conta que na UPA recebeu a seguinte
dica: "A médica disse que, sempre que eu suspeitasse de alguma coisa, era
para colocar o Davi deitado no colchão para observar a respiração dele, ver se
estava mais rápida, se o peito abaixava e doía".
A atenção deve ser redobrada com os menores de um ano de
idade. "Eles deixam de mamar e há batimento de asa de nariz, sinal de
maior esforço necessário para respirar", comenta o pediatra Joseph
El-Mann, que atende em clínica particular e coordena o serviço de pediatria do
Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro.
O diagnóstico de pneumonia em bebês de até três meses é
sempre considerado grave e ocorre a internação. Nas crianças maiores, febre
alta não é parâmetro para ser hospitalizada, mas, sim, insuficiência
respiratória e baixa oxigenação - além de uma avaliação sobre se o menor
conseguirá receber tratamento adequado em casa.
Outro sintoma que não deve ser ignorado pelos pais é o
cansaço dos filhos. "Em uma gripe forte, por exemplo, observam-se períodos
de melhora, mas na pneumonia há um estado de prostração constante",
explica El-Mann.
De acordo com a Academia Americana de Pediatria, a maioria dos
casos de pneumonia é derivada de infecções das vias aéreas superiores. Uma
gripe maltratada, portanto, pode desencadear na doença. Assim, é importante que
os pais ou cuidadores façam essa observação, como a ensinada a Valquíria, e
identifiquem possíveis sintomas.
Pneumonia silenciosa
A médica Patrícia Barreto rechaça a existência da chamada
pneumonia assintomática. "Os sintomas podem não ser intensos a ponto de
serem percebidos, mas eles estarão lá", diz. Há quem use o termo
"pneumonia silenciosa" − sem um desconforto respiratório
significativo, a doença passaria despercebida inicialmente.
Lorenzo Oliveira, 3 anos, está internado há uma semana em um
hospital no Rio de Janeiro. A mãe, Marcela Nascimento, 37, conta que ele não
apresentava tosse nem coriza, somente febre. "O exame de sangue detectou
que havia uma infecção e fizeram um raio-X do tórax e da face. Foi
diagnosticada a pneumonia e iniciaram o tratamento com antibiótico. No terceiro
dia, a febre foi embora e voltou o apetite", relata.
Outro termo que a especialista da Fiocruz prefere não
utilizar é "princípio de pneumonia".
"A criança tem ou não tem pneumonia. A doença pode ser
numa área pequena do pulmão, mas não é porque está começando. Ela já existe. O
problema é que os pais podem traduzir como algo bastante simples, não ocorrendo
um empenho correto no tratamento e pode evoluir para um quadro mais
sério", esclarece Barreto.
A American Lung Association conta 30 tipos de pneumonia. Em
geral, são causadas por vírus, bactérias e fungos nos casos de pneumonia
comunitária, isto é, fora do ambiente hospitalar. Segundo a associação, a
doença pode se espalhar pela tosse, espirros, toque ou até pela respiração. A
maioria dos casos é de infecção viral e a melhora é observada entre uma a três
semanas.
Os principais sintomas da pneumonia
Para caracterizar a doença, um ou vários desses sinais podem
aparecer:
*Tosse;
*Dor no tórax;
*Alterações da pressão arterial;
*Expectoração com secreção amarelada;
*Falta de ar;
*Confusão mental;
*Estado de fraqueza e cansaço constante;
*Febre alta (mas ausência de febre não descarta a doença).
Fonte: Ministério da Saúde/Fiocruz
Por ser difícil diferenciar clinicamente um caso viral de um
bacteriano, alguns pediatras preferem iniciar logo o tratamento com
antibiótico. Outros profissionais, contudo, criticam esse hábito já que o uso
de antibióticos indiscriminadamente poderia agravar as resistências ao remédio,
favorecendo o surgimento de superbactérias.
No tratamento, não são indicados inibidores da tosse − esse
é um importante mecanismo do corpo para promover a limpeza do pulmão.
Óbitos
Assim que os pais suspeitarem que os filhos apresentam
problemas respiratórios, a orientação é levar a criança para ser examinada por
um profissional da saúde imediatamente porque o quadro pode ser agravar em
questão de horas e, no caso de menores com o sistema imunológico já debilitado,
pode levar até mesmo ao óbito.
De acordo com o relatório da Save the Children, divulgado na
semana passada, duas crianças morrem a cada minuto devido à pneumonia. Em 2015,
foram 920 mil óbitos, a maioria em países pobres do sul da Ásia e da África
Subsaariana, daí a alcunha de "a doença da pobreza", conforme a ONG.
Em 2030, data para que todos os governos implementem os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável da ONU, ainda serão 730 mil de fatalidades nessa faixa etária,
prevê o estudo.
Em nota à reportagem, o Ministério da Saúde esclareceu que a
pneumonia não é uma doença de notificação compulsória no Brasil,
consequentemente, não existiriam dados oficiais sobre a patologia. Segundo a
Save the Children, em 2015, a taxa de mortalidade por pneumonia em crianças
abaixo de cinco anos no Brasil era de 1,5 por 1000 nascimentos, o triplo do
verificado nos Estados Unidos.
O risco de morte por pneumonia é maior nas crianças
desnutridas, portadoras de doenças crônicas e que já chegam ao hospital com
sinais de complicação, além disso influencia o baixo nível sócio econômico.
"As crianças morrem de pneumonia porque a elas são
negados os benefícios da prevenção, diagnóstico acurado e tratamento",
ressalta a ONG Save the Children. Atualmente, cerca de 400 milhões de pessoas
estão à margem dos sistemas de saúde, segundo a Save the Children. Por isso
grande parte dos óbitos ocorre porque muitas crianças não chegam nem a se
consultar com um profissional.
Um dos sintomas mais preocupantes é a hipoxemia, a
insuficiência de oxigênio no sangue que pode afetar os órgãos. Há situações em
que os pulmões precisam ser drenados para evitar complicações como choque,
hipotensão, insuficiência respiratória, atelectasia (colapso completo ou
parcial do pulmão) e infecção generalizada.
Em regiões carentes, a criança pode chegar ao pronto-socorro
com um quadro avançado. O relatório da Save the Children diz que prestadores de
serviço de saúde às vezes não têm treinamento adequado e encontram dificuldades
para contar a frequência respiratória de um bebê. Além disso, a pele azulada,
indicativo da falta de oxigênio, pode não ser detectada em crianças negras,
ressalta o estudo.
Para alertar a população sobre essa patologia, tão comum nos
meses do outono e do inverno, foi estabelecido, em 2009, o Dia Mundial da
Pneumonia, em 12 de novembro. Entre as iniciativas, está a disseminação de
informações sobre prevenção. A imunização é a mais importante. No Brasil,
conforme o Ministério da Saúde, a vacina pneumocócica (contra pneumonia)
conjugada foi introduzida no calendário básico de imunização infantil do Brasil
para menores de dois anos em 2010.
Também deve-se evitar aglomerações, como levar bebês a
shopping centers ou supermercados. Ter uma boa alimentação, deixar a casa
arejada e lavar as mãos, principalmente quando já existe alguém da família
doente, são outras atitudes preventivas essenciais.
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