Elo perdido entre os cães domésticos e seus ancestrais, o
cão cantor dos planaltos de Nova Guiné é considerado o cachorro mais antigo do
mundo
(NGHWDF/Reprodução) |
O cão selvagem dos planaltos da Nova Guiné (Canis lupus
dingo) – também conhecido como “cão cantor” por seu uivo agudo – é uma espécie
de elo perdido entre os cães domésticos atuais e os canídeos selvagens que lhes
deram origem há alguns milhares de anos. Agora, mais de meio século depois de
ter sido avistado pela última vez nas matas de grande altitude de seu habitat
natural, a ilha de Papua Nova-Guiné, um grupo com 15 espécimes do cachorro
sumido deu “oi” aos participantes de uma expedição – provando que ele não está
extinto na natureza, e permitindo análises de DNA inéditas.
O dingo é descrito na literatura científica como um animal
inteligente e tímido, que prefere viver solitário em regiões de mata fechada.
Um comportamento ótimo para se safar da extinção, sem dúvida, mas que torna até
uma foto um feito quase impossível. O primeiro suposto registro do cão cantor
em seu estado natural foi obra do paleontólogo australiano Tim Flannery em 1989
– 23 anos depois, em 2012, Tom Hewitt, diretor de uma empresa de turismo
ecológico que faz expedições na região, fez um clique que foi motivo de muita
especulação e rendeu uma entrevista na Scientific American. Até hoje não foi
possível confirmar se os animais retratados por Hewitt e Flannery eram mesmo
dingos.
De fato, ele é tão talentoso em se esconder que por meio
século foi considerado extinto na natureza – cerca de 300 exemplares em
cativeiro permitiram estudos mais detalhados e cliques fofos como o deste
filhote aqui. “A descoberta e a confirmação do cão dos planaltos pela primeira
vez em mais de meio século é uma oportunidade incrível para a ciência”,
declarou à imprensa o grupo de preservação que está por trás da descoberta.
“Nossa última expedição, em 2016, foi capaz de localizar, observar e coletar
evidências biológicas, e confirmar por meio de testes de DNA que pelo menos
alguns espécimes ainda existem e se reproduzem em regiões de grande altitude da
Nova Guiné.” O material, acumulado por pesquisadores da Universidade de Papua
em parceria com uma expedição liderada pelo biólogo James McIntyre, inclui mais
de 140 fotos. O primeiro indício foi uma pegada registrada em setembro do ano
passado.
Apesar do ânimo do NGHWDF (a sigla que dá nome ao grupo) com
a descoberta dos 15 espécimes mencionados anteriormente, há muita discussão no
meio científico sobre a validade de classificar o C. l. dingo – também chamado
de C. l. hallstromi – como uma espécie ou subespécie única, e não como uma mera
variedade de cão selvagem. Ele é um resquício das primeiras tentativas de domesticação
de canídeos pela espécie humana, mas passou mais de 6 mil anos isolado na
ilha – tempo suficiente para que ele
desenvolvesse aparência e características genéticas únicas. Entusiastas o
consideram um dos cães mais antigos do mundo, mas há especialistas mais
céticos.
Em um artigo publicado em 2016, dois pesquisadores da
Universidade de Melbourne, na Austrália, afirmam que não há evidências
suficientes para dar ao cão cantor uma classificação diferente da dos demais
canídeos domésticos anteriores à colonização da Nova Guiné pelos
britânicos. “Não há provas de que esse
tipo específico de cachorro de grande altitude seja uma espécie selvagem que
sempre viveu isolada, nem de que ele não tenha se originado de animais
domésticos em vilarejos da região.” Eles também afirmam que vários mascotes de
tribos que sobreviveram à colonização carregam material genético de canídeos
também anteriores à chegada dos europeus – ou seja, que o C. l. dingo pode até
ser vintage, mas não é exclusividade.
De qualquer maneira, a descoberta de uma quantidade razoável
de C. l. dingo em seu estado natural é um passo importante para pôr fim nessa
discussão – a NGHWDF afirma que um artigo científico com conclusões já está na
reta final da publicação. O cão mais velho do mundo, afinal, pode esperar.
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